Vamos tratar de um conceito muito importante, o Desejo. Não se trata de vontade, de querer, de anseio. O Desejo é formado pelas palavras com as quais um sujeito é constituído mesmo antes de seu nascimento. Assim, quando um casal resolve ter um filho, o Desejo é esta comunicação que se estabelece entre eles, pois, no Desejo dos pais já funciona uma série de elementos que os conduzem a ter um filho. Quando o filho nasce vai receber o que foi dito dele antes, e de alguma forma isso vai determinar seu destino.
O mito de Édipo expressa bem esta questão. Os pais de Édipo vão consultar o Oráculo e este diz que haverá uma tragédia na qual o filho matará o pai e depois casará com a mãe. Impressionados, os pais de Édipo o abandonam. Porém, ele vai cumprir em si tudo aquilo que lhe foi traçado pelo oráculo. Isto é o inconsciente. São os efeitos das falas que incidem sobre um sujeito mesmo que ele nada saiba disso.
O psicanalista francês Jacques Lacan diz algo bem interessante sobre o Édipo: “Tudo se desenrola em função do oráculo e pelo fato de ele ser realmente um outro que aquilo que ele realiza como sendo sua história ele é o filho de Jocasta e Laio, e ele vai pela vida ignorando isto. Toda a pulsação do drama de seu destino, de ponta a ponta, desde o começo até o fim, é devida a este velamento do discurso, que é a realidade sem que ele o saiba.”
Muito do que vivemos e somos resulta daquilo que falaram em torno de nós e como o Desejo se constituiu no psiquismo. O Desejo é uma organização de palavras, ideias, afetos, significações, histórias e tem como resultado uma movimentação, pulsação que conduzem nossas vidas. Essa movimentação que o Desejo causa decorre do fato de que algo está faltando. Existe, portanto um vazio, um espaço de falta que causam no ser humano um tremendo mal-estar, uma angústia. Cada um vai se arranjar com esta falta de uma maneira muito particular. Se por um lado isso é o que nos angustia, por outro lado essa falta é o que garante estarmos vivos. Se houvesse a possibilidade de uma completude, de uma ausência de falta, de angústia, não sobraria espaço para produzirmos coisas, para nos movimentarmos.
Acontece que os seres humanos querem acabar com essa falta e acabam acreditando que coisas podem ser colocadas neste espaço, neste vazio. Aqui surgem os cobiçados objetos humanos bem como suas crenças e esperanças. E uma delas é que um filho possa ocupar esse lugar. Que missão hein?
Falaremos mais sobre isso.
Aguardo vocês.
Célio Pinheiro é Psicanalista e Antropólogo. Experiência clínica em consultório psicanalítico. Trabalhos com Grupos e equipes profissionais. Atuação nas seguintes áreas temáticas: Psicanálise, Antropologia da saúde, Saúde Coletiva, Saúde Mental, estudos sobre adoecimento psíquico. Trabalhos preventivos e de combate à depressão, melancolia, suicídio e respectivos projetos de prevenção. Ministra cursos de formação em Psicanálise e cursos de extensão em Universidades. Participa de Projetos de Saúde Preventiva e Saúde Mental. Coordenador do projeto Cinema e Psicanálise.